Maria Heloisa A. Pinheiro

 

"YAMAUBA E AS MULHERES DO PERÍODO EDO: ENTRE O SOBRENATURAL E O REAL NA CONSTRUÇÃO DO FEMININO"


Esse texto trata da análise de uma das fontes que faz parte de uma iniciação científica financiada pelo CNPq intitulada “ O pensamento japonês sobre o feminino : uma análise da relação entre as mulheres japonesas no período edo com o conto da bruxa da montanha”.

 

O que se pode retirar do sobrenatural para entender a história do real? Pensando em conexões entre o real e o imaginário quais são as ligações entre o conto da Yamauba e as mulheres japonesas do período edo?

 

Presente no livro “Ancient tales at modern Japan: an anthology of japanese folktales”, de autoria da Fanny Hagin Mayer, o conto  “The Wife Who Didn't Eat”,  apresenta  a história de um lenhador que tinha o desejo de se casar com uma mulher que não comesse nada. E tal desejo se realiza quando inesperadamente uma mulher, descrita com aparência estranha, foi até a casa do lenhador e lhe pediu para ser tomada como esposa afirmando que não iria comer nada. Com o passar dos dias o homem percebe que seu estoque de comida diminuía cada vez mais, então ele finge ir a cidade mas se esconde nas vigas do seu estábulo, observando sua esposa, que prepara uma grande quantidade de comida, estranhamente a mulher mexe no cabelo fazendo surgir uma enorme boca no topo da sua cabeça.

 

Após terminar a refeição a mulher volta a agir naturalmente, e o lenhador saindo das vigas e dizendo voltar da cidade finge que não presenciou nada daquilo. Na manhã seguinte o homem informa que irá devolver a mulher para sua família, ela o questiona sobre o que será dado a mesma devido a separação, o lenhador lhe dá a banheira. A partir desse ponto a história passa a mostrar a verdade sobre a mulher, que finge ver um verme na banheira e pede para o lenhador ir tirá-lo, ao se aproximar ela o joga dentro da banheira pelos pés e se transforma em uma Yamauba. A youkai corre com o homem em suas costas, informando que estava levando alimento e chamando outras para a refeição, porém o homem conseguiu se agarrar em um galho de árvore e escapar correndo na direção contrária. Ao chegar no local de encontro onde todas estavam reunidas e baixar a banheira, Yamauba percebe a ausência do homem e refaz seu caminho na busca pelo lenhador.

 

Entretanto, o ele se escondeu entre Iris e artemísia e a Yamauba o vendo e sabendo que se colocasse suas mãos nas plantas ela apodreceria, voltou para a colina por não ter nada que pudesse ser feito. O homem, percebendo como as plantas afastaram a Yamauba, colocou iris e artemísias na sua cabeça e na cintura e também no seu telhado e na entrada de sua casa. O conto termina afirmando que a Yamauba nunca mais voltou. [MAYER, 1985, p. 119- 120]

 

Na dissertação de Aline Majuri, “DETA! O yokai e as transformações das criaturas sobrenaturais japonesas”, a autora pontua a ligação das figuras dos youkais com o outro marginalizado, excluído, deixado a solidão. Isso pode ser percebido pelas aparências dos youkais, pelo local onde estes vivem, pelo horário a qual é “destinado” a eles e como sua história é narrada - inicialmente - para levar e gerar medo e horror. No conto apresentado neste trabalho, quando a Yamauba é descoberta a mesma rapidamente perde a forma de jovem bela, se mostrando fisicamente como é uma mulher idosa, causando medo de ser encontrada, morando em uma montanha, tenho uma fome insaciável, vivendo com o único objetivo de procurar saciar essa fome.

 

O pesquisador Dylan Foster, no seu livro “The book of youkai”, aponta a figura de Yamamba como a youkai mais conhecida no Japão, abordando como essa é representada dentro de uma dualidade na qual é retratada em momentos como um ser aterrorizante e em outros contos de forma benéfica, a fisionomia é algo que chama atenção quando se trata dessa personagem. Dylan descreve a youkai como dona de olhos penetrantes, um boca grande e tendo cabelo comprido, segundo ele  é assim que a bruxa da montagem é geralmente retratada.

 

Noriko Tsunoda Reider, em seu livro “Mountain Witches: Yamauba”, cita o surgimento de várias lendas youkai no período muromachi, apontando para o fato curioso em que no período moderno houve uma crescente nas histórias de youkai femininas tendo como possível explicação o fato das mulheres terem sido limitadas das atividades sociais, ficando confinadas e reprimidas pelas regras normais e culturais da sociedade. A  autora também debate sobre a montanha ser parte da identidade da Yamauba, apontando que em algumas culturas as montanhas são entendidas como locais sagrados e no Japão tal realidade não é diferente, os japoneses consideram as montanhas como morada dos espíritos - mortos ou ancestrais -, além de serem consideradas como uma espécie de ponte entre este mundo e o outro mundo.

 

 

 

O imaginário japonês em torno das montanhas vincula estes locais com o sagrado, e a ocupação, a ida das mulheres para as montanhas era restrita, pois essas eram consideradas inferiores não podendo visitar lugares sagrados pois não seriam capazes de alcançar estados espirituais mais elevados. [DEAL, William. 2006, p. 218] Por outro lado, havia homens budistas os quais tinham visões mais favoráveis à figura feminina e suas capacidades espirituais, sendo entendidas como detentora de uma vida espiritual. Além disso, no Período Edo o budismo serviu como auxílio para mulheres que buscavam outra alternativa além do casamento e/ou uma saída de um casamento ruim, já que o templo acolhia essas. A opção pela ida ao budismo e a dedicação à religião pode ser entendida como uma maneira de buscar autonomia por parte dessas mulheres sobre suas próprias vidas e escolhas em uma sociedade que não deixava as mesmas tomarem suas decisões.

 

Outra obra na qual a figura da Yamauba aparece é o livro “A psique japonesa”, do psicólogo japonês Hayao Kawai, sendo citado várias versões da lenda. Dentre eles, é mostrado o conto o qual a Yamanba se apresenta como uma mulher que não come nada, onde Kawai analisa e aponta que a moral deste conto está em ensinar sobre o valor das palavras do dia a dia e do poder dos desejos se tornarem realidade - já que o homem fala do seu desejo de encontrar uma mulher a qual não coma nada e não lhe dê despesas. Hayao analisa a questão em torno do ato de comer que está presente em várias versões do conto de Yamauba - seja por ela comer muita comida, por comer homens, crianças e até seu próprio neto - colocando o “comer” como um ato de função assimiladora e de identificação, podendo significar também uma transformação o comer não só para manter a vida mas para se desenvolver ou se transformar.

 

Também tratado por  Kawai é a ação extrema do conto onde Yamauba inicialmente afirma não comer, quando em segredo devora desesperadamente a comida da sua casa, o autor levanta a questão da anorexia nervosa que faz o indivíduo tomar atitudes tão opostas, é colocado que “Ela [a história] contém valores coletivo e está ligada diretamente a tragédias bem comuns em nosso dia-a-dia”. [KAWAI, 2007 p.57] Ademais, outra questão trabalhada no capítulo diz a respeito da expulsão da Yamauba - que na maior parte dos casos é expulsa e não morta - como uma forma de entendimento que não se pode acabar com o mal, e o melhor a se fazer é ficar atento para escapar deste.

 

 

Mas, o que essa lenda tem a retratar sobre a realidade das mulheres japonesas no Período Edo?

 

No texto “The Edo Period: Confucianism, Nativism, and Popular Religion”, a autora Bárbara R. Ambros discute sobre a concretização da família patrilinear e a difusão dos valores confucionistas durante o período edo. De acordo com o texto, foi durante o período muromachi, no período de guerras, que o formato de família patrilinear surgiu na sociedade japonesa servindo para garantir a transferência de herança no momento de crise política e militar. Tal modelo, durante o período Tokugawa, se espalhou para além da elite guerreira, chegando aos comerciantes e proprietários de terras que se encontravam preocupados com a transição de seus bens pela sua herança. Esse sistema privou as mulheres da elite dos seus direitos devido a diminuição no direito da herança, é válido notar que as estruturas patriarcais não atingiram todas as camadas sociais da mesma maneira. Como também tratado no texto, algumas mulheres conseguiram fugir - indiretamente - do sistema patrilinear através da devoção à religião, seja antes ou depois do casamento, algumas seguiam por esse caminho após o divocio. Outra alternativa era a prostituição, a maioria não tiveram o poder de escolha entre os papeis de esposa ou prostituta, no começo do periodo edo essas eram vistas como as filhas que se sacrificavam pela familia, foi na segunda metade do periodo - quando a prostituição teve uma aumento significativo - que o julgamento a elas aumentaram, as condenando como egoistas por colocarem o lucro a frente da familia. [AMBROS, 2015 , p. 101]

 

A influência do neo confucionismo, no período Tokugawa, para o regime dominante se mostrou uma importante e eficaz ideologia sociopolítica, prezando por uma sociedade hierárquica. O esforço, por parte dos estudiosos confucionistas, para promover os valores neo confucionismo na sociedade japonesa ocorreu pelo incômodo da influência que as esposas dos daimios e dos xoguns tinham na política. De acordo com Ambros, a cartilha confusionista mais seguida pelas mulheres japonesa nesse período foi a “Great Learning for Women” - atribuída ao estudioso Kaibara Ekken (1630-1714) -, a qual enfatiza a importância da educação para as meninas aprenderem a servirem seus sogros e seu marido, educadas a evitarem a arrogância, o discurso áspero, a raiva, a inveja e o orgulho, colocados como inatos em todas as mulheres estando mais aparentes nas mulheres de camadas baixas da sociedade. A cartilha incentiva que as mulheres cultivassem virtudes como a obediência, a calma, a gentileza e a castidade, e após o casamento essas devem submeter-se completamente ao marido o servindo com obediência e diligência, também não deve expressar ciúmes, buscando manter a harmonia familiar dedicando-se às atividades domésticas, não se envolvendo em assuntos pessoais - do marido- e em atividades religiosas.

 

Outro texto que teve forte influência durante o período Tokugawa foi o “Onna Daigaku”, o qual oferecia uma perspectiva moralista, moldada pelo neo-confucionismo, sobre o papel que as mulheres deveriam desempenhar na sociedade. Segundo o texto, as mulheres deviam obediência ao seu pai, irmão(s), marido e filho(s), trabalhar sem reclamar, e em caso de desobediência, problemas de saúde e na ausência de filhos, o marido poderia se divorciar. [DEAL, 2006 p.116.] Entretanto, não é possível afirmar que o texto foi seguido amplamente, pois sempre há exceções como é o caso das mulheres do meio rural as quais tinham mais liberdade para escolherem seus maridos, e em outros casos os homens foram adotados pelas famílias de suas esposas e consequentemente essas tinham mais espaço para opinar.

 

A realidade feminina nos distritos dos prazeres, no Japão do Período Edo, lugar o qual a prostituição foi institucionalizada e supervisionada pelo shogunato tinha suas peculiaridades. Nesses espaços, existentes em várias cidades japonesas, ocorria uma dualidade na realidade feminina, a qual as cortesãs de alto nível desfrutava da sua beleza e dos seus conhecimentos para entreter seus clientes ganhando reconhecimento, e por outro lado, vivenciado pela maioria das mulheres, estavam as que trabalhavam nos bordéis sendo controladas pelos proprietários, movidas pelo desespero devido a pobreza e a falta de opções para sobreviver. Em 1629 foi criado um édipo o qual limitava a atuação das cortesãs e prostitutas a bairros específicos da cidade, havendo nesses espaços uma concentração de teatros, bordéis e restaurantes o que facilitava o controle dos impostos e social pelo shogun, contribuindo para o surgimento e a divisão destas mulheres em dois níveis: as yujo, que lidavam com o público geral e as oiran, tinham mais experiências e conhecimentos e eram mais procuradas. [SILVA NETA, 2015, np]

 

Uma forma artística o qual era usada para representar as mulheres no Período Edo é a Ukiyo-e, uma maneira pintar que englobou variados tema, mas têm destaque as obras eróticas retratando as cortesãs, como pontuou Monta Hayakawa em seu texto:

 

“Pornographie enquanto tradução de shunga, para os países ocidentais, tem atualmente o significado de “pintura de prostitutas” sendo mais freqüente compreender as mulheres representadas no ukiyo-e shunga principalmente como yüjo (mulher profissional), mas, como todas as mulheres representadas no ukiyo-e vestem sem exceção belíssimos quimonos e são muito bonitas, se não se tiver conhecimento dos vestuários e acessórios femininos correntes no período Edo, não se pode discerni-las como sendo adornadas yüjo ou mulheres outras de apurado senso estético.” [HAYAKAWA, 2008, p. 231-232.]

 

Ainda tratando da realidade feminina no trabalho como forma de entreter os homens, as gueixas - na tradução literal pessoa da arte - eram mulheres as quais eram pagas para entreter os homens com sua arte, sem nenhum tipo de envolvimento sexual. Foi no período Tokugawa que foi criado em 1779 o decreto no qual reconhecia a profissão de gueixa, as quais passaram a ter seus próprios distritos, cartórios e registros. Geralmente, o treinamento de uma gueixa se iniciava na infância, seja essas crianças filhas “adotivas” da casa onde viviam as gueixas, seja elas as filhas das próprias gueixas. O estudo dessas meninas incluía canto, dança, arte do chá e estudo de instrumentos musicais tradicionais, o conhecimento social de como se portar em público, como se sentar, se vestir, a participação em festa e como conseguir bons contatos eram passada pelas gueixas para suas aprendizes, uma troca que seria pago no futuro pela Maiko - como era chamado a gueixa aprendiz.

 

O período edo foi marcado, principalmente, pela estabilidade da sociedade japonesa. Sem conflitos armados, dentro do próprio território, foi possível organizar a sociedade em torno de outros pontos, como o comércio, as artes, e/ou até mesmo o crescimento dos distritos dos prazeres, o maior desenvolvimento da cultura população, a adesão de novas práticas sociais, culturais, agrícolas, o crescimento do neo-confucionismo. Tudo isso influenciou na forma como as mulheres eram entendidas no neste período.

 

Uma youkai que é representada como uma mulher idosa que vive isolada em uma montanha, basicamente, em prol da sua alimentação mostra como a sociedade japonesa entendia a perda da função social das mulheres conforme sua idade vai aumentando, a retratação de uma figura que gera horror só de ser vista vai em oposição às mulheres que eram procuradas nos distritos dos prazeres e das gueixas.

 

 

Na lenda, Yamauba aparece disfarçada diretamente na casa de um homem, que pode ter a chamado quando pediu por uma mulher que não comesse nada, descrita com uma aparência estranha, essa engana o lenhador e come quase toda sua comida e após ser descoberta a youkai se revela como uma Yamauba. A força sobre humana, a fome exagerada e a mudança de aparência - pouco descrita - características dessa youkai são fatores que geram o medo a essa figura. 

 

A fome insaciável, o desejo de comer carne humana, a força, a agilidade, a aparência estranha, o local de moradia, o medo que gera a figura masculina, o conhecimento da geografia do local, o conto trata de uma mulher que sai da sua posição social, além de ser retratada como um ser sobrenatural. Uma Yamauba não corresponde à sociedade, também não está inserida nela, a youkai está na margem excluída. Uma Yamauba não tem filhos, não casa, não constitui família, ela também não trabalha em prol do entretenimento masculino, ela não é paga por homens e nem depende de alguém. Ela está por conta própria e seu único vínculo ao masculino é quando deseja pegar sua comida, ou fazê-los de alimento.

 

Em uma sociedade cada vez mais envolvida pelo sistema patriarcal e influenciada pelo neo-confucionismo, como era a sociedade japonesa do período edo, uma Yamauba não tem função social e ainda representava a contradição do esperado de uma mulher. Afinal, a mesma vivia sozinha, se defendia sozinha, se alimentava sozinha, não havia necessidade de vínculos emocionais e sociais com outros seres. A figura da bruxa da montanha, pode ser entendida como uma representação feminina que se basta, que não precisa de ligações, mas na própria narrativa é subalternizada pela sua aparência, talvez para sinalizar inconscientemente que uma mulher que se basta se torna feia e assustadora, e pode se tornar um monstro. Para reforçar o papel das mulheres na sociedade enquanto filhas, esposas, mães e avós, sempre devendo obediência a alguma figura masculina, cumprindo seu papel de cuidadora seja do seu marido, dos seus filhos, dos seus pais.

 

Referências:

 

Maria Heloisa Andrade Pinheiro, graduanda do curso de História pela Universidade Federal de Viçosa. [http://lattes.cnpq.br/7835442065541390]

 

AMBROS, Barbara R.. “The Edo Period: Confucianism, Nativism, and Popular Religion”. In: AMBROS, Barbara R.. Women in Japanese Religions. New York: New York University Press, 2015.

DEAL, William E.. “Handbook to life in medieval & early modern Japan”. New York: Oxford University Press, 2006.

FOSTER, Michael Dylan. The Book of Youkais. California: University of California Press, 2015.

HAYAKAWA, Monta. “Usos e costumes sexuais e a cultura do sexo do período Edo nas pinturas eróticas Ukiyo-e”. Estudos Japoneses, 2008. Disponível em: https://www.journals.usp.br/ej/article/view/142965

KAWAI.  A psique japonesa – grandes temas dos contos de fadas japoneses. São Paulo: Paulus, 2007.

MAEKAWA, Jennifer Yui. A representação da mulher no conto Yamanba no Bishō. 2018. 38 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Língua e Literatura Japonesa)—Universidade de Brasília, Brasília, 2018. Disponível em: https://bdm.unb.br/handle/10483/23256

MAYER. Ancient Tales in Modern Japan: An Anthology of Japanese Folk Tales. Indiana: Indiana University Press, 1985.

REIDER. Mountain Witches: Yamauba. Colorado: Utah State University Press, 2021.

SILVA NETA, M. C. O. . “A mulher japonesa na história: uma breve contextualização”. In:KYÛSAKU, Yumeno . Shôjo Jigoku: o inferno das garotas. Tradução: Felipe Medeiros. São José dos Pinhais: Urso, 2021.

SILVA NETA, M. C. O.. “'A Flor e o Mundo de Salgueiro': As Gueixas na História.” Caravana 25 anos da ANPUH Pernambuco. Dezembro, 2015. Disponível em: https://www.eeh2016.anpuh-rs.org.br/resources/pe/anais/caravana/01/05.SILVA%20NETA,%20Maria%20do%20Carmo%20Oliveira%20da..pdf

WANDERLEY, Aline Majuri. DETA! O yokai e as transformações das criaturas sobrenaturais japonesas. 2013. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8157/tde-22102013-103444/

 

 

14 comentários:

  1. Ana Paula Sanvido Lara3 de dezembro de 2024 às 11:50

    Bom dia! Parabéns pelo artigo.

    Achei interessante notar que o mesmo acontecia com a Yamauba e a figura da Bruxa, sendo ambas mulheres independentes. Podemos considerar que essas histórias eram criadas para reforçar na cultura a ideia de que as mulheres deveriam ser submissas e dependentes dos homens ao longo de suas vidas ou elas somente reforçavam a exclusão das que saíam do que era considerado padrão?

    Ana Paula Sanvido Lara

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    1. Olá Ana! Obrigada por ler e comentar meu artigo <3

      Acredito que a figura da Yamauba sirva para reforçar as duas opções pontuadas no seu questionamento.

      Com o fortalecimento do confucionismo e o neo-confucionismo, no Período Edo, as mulheres são limitadas e perdem ainda mais seus espaços sociais, consequentemente ficam cada vez mais dependentes da figura masculina; mas por outro lado, no livro do William Deal (presente nas referencias), alguns templos budistas acolhiam mulheres em situação de vulnerabilidade, seja mulheres viúvas, divorciadas [...]

      A minha conclusão é que a lenda da Yamauba inicialmente é usada para reforçar a submissão e ensinar que as mulheres devem ocupar seus papeis sociais. Mas, em uma segunda analise, também, podemos entender a figura da YamaUba como maneira de mostrar quais eram as mulheres que a sociedade japonesa temiam, o que as mulheres não deveriam se tornar. Afinal, a YamaUba também poder ser vista como uma mulher livre dos padrões sociais.

      Espero ter respondido sua questão, qualquer outra duvida estou a disposição. :)

      Maria Heloisa Andrade Pinheiro

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  2. Boa noite, primeiramente parabéns pelo texto! Ele está excelente!
    Durante a leitura percebi algumas questões que se assemelham com alguns mitos coreanos, principalmente o Mito da Criação. Primeiro pela questão do cenário; uma montanha, e a artemísia; que está presente em ambos.
    Gostaria de perguntar principalmente sobre a artemísia, você sabe se na história da Yamauba ela possui algum significado específico, ou se tem alguma relação com a religião?

    Suelen Cecília Viera Silva

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    1. Não estou conseguindo responde-la por aqui. Mas sua respostas está em um outro comentário.

      Obrigada por comentar :)

      Maria Heloisa Andrade Pinheiro

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  3. Interessante demais o seu trabalho! Curiosamente a palavra "Yamanba" me faz lembrar das "yabas", não sei se tem alguma ligação etimológica, se souber eu gostaria muito de saber. Ao compreender como funcionava a leitura social sobre as mulheres naquele período Edo, com essas lendas e posições sociais ocupadas pelas mulheres, fico com a dúvida, se estas percepções passadas ainda nos dias atuais reverberam impactos estruturais? E se estas lendas ainda são presentes no imaginário social através da tradição oral?
    Raíssa Santos Valeriano

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    1. Olá Raíssa, obrigada por ler meu texto! <3

      O nome YamaUba é composto por Yama que significa montanha e Uba que significa bruxa, assim o nome YamaUba seria a "bruxa da montanha".

      Pesquisando encontrei Yabás como "rainha mãe" sendo orixás femininos que representam forças da natureza, a gestão da vida e o poder do matriarcado, certo?

      Atualmente, eu não tenho conhecimento de nenhuma versão da lenda que a Yamauba apareça com semelhanças a essa descrição das Yabás, o mais próximo disso seria a versão em que a Yamauba aparece como mãe do Kintaro (herói japonês), mas perceba que nesse caso ela passa de protagonista a coadjuvante dentro do conto.

      E sobre as percepções passadas da lenda que podem estar presente na sociedade japonesa, teve (não sei se isso ainda acontece) uma tribo de yamanba que se inspirava na personagem como um sub estilo de moda/maquiagem , você pode dar uma olhada nesses links:

      1. https://www.japaoemfoco.com/yamambas-uma-moda-bem-esquisita-do-japao/
      2. https://br.pinterest.com/mzmedici/yamanba/

      Jennifer Yui Maekawa, na sua dissertação, “A representação da mulher no conto Yamanba no Bisho”, tem um trabalho interessante no qual pensa uma versão da Yamauba na qual ela passa sua vida toda se dedicando a família e deixando seus desejos de lado em prol de agradar os demais, e após sua morte sua filha passa a herdar o seu dom de ler mentes. Jennifer faz um paralelo entre o conto e as mulheres japonesas que pela família deixam seus empregos e passam a se dedicar ao lar, marido e filhos.

      Acredito que os estereótipos da Yamauba ainda existam e influenciem sim o imaginário e o pensamento japonês a respeito das mulheres que não se submetem.

      A respeito da tradição oral não vou saber responder com certeza. No Período Edo existia uma brincadeira que consistia em contos histórias assustadoras ao redor de uma lanterna no período noturno - Hyaku Monogatari. Atualmente, pela sociedade das telas não sei te responder como essas lendas são transmitidas.

      Eu mesma descobri a Yamauba em uma aula de japonês de halloween, na qual a sensei estava contando sobre algumas lendas youkais, e me lembro dela falar que sua avó tinha contado alguns historias para ela quando criança.

      Espero tê-la ajudado, qualquer duvida estou a disposição. :)

      Maria Heloisa Andrade Pinheiro

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  4. Olá, parabéns pelo trabalho! Muito interessante a discussão levantada.
    Me chamou atenção ao longo de seu texto a dimensão que a lenda pode tomar no imaginário e a partir disso fiquei pensando nas suas representações artísticas e me veio a dúvida a respeiro de qual seria o meio artistico encontrado para consolidar sua história em uma cultura popular, como esse conto circulava daquele contexto em diante?

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  5. Olá, parabéns pelo trabalho! Muito interessante a discussão levantada!
    Me chamou atenção ao longo de seu texto a dimensão que a lenda pode tomar no imaginário. A partir disso fiquei pensando nas suas representações artísticas e me veio a dúvida a respeiro de qual seria o meio artistico encontrado para consolidar a história da Yamauba em uma cultura popular, como esse conto circulava daquele contexto em diante?
    Mateus Borges Firme

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    1. Olá Mateus, obrigada por ler meu texto <3

      No livro "The book of youkais" do Dylan Foster ele fala sobre a presença da yamauba em peças, se referindo o Kabuki.

      Além das peças, teve a representação dessa youkai pelos Ukiyo-e (xilogravuras japonesas) como o de Toriyama Senkien no Periodo Edo.(https://www.flickr.com/photos/45841957@N06/4208120715)

      Como existem várias versões da lenda da YamaUba as formas que esta foi representada também é múltipla. Abaixo vou deixar alguns links para você da uma olhada em imagens que contribuíram para fortalecer a figura da yamauba dentro da cultura popular:

      "Two kabuki actors playing and old women (yamauba) and aboy (Kaidomaru) de UtagawaYoshiiku: https://artsandculture.google.com/asset/two-kabuki-actors-playing-an-old-woman-yamauba-and-a-boy-kaidomaru-utagawa-yoshiiku-japanese-1833-1904-constituentid-1268-artist/AQHJ7Eu9Roc2BQ?hl=en

      "Yamauba Descending on a Cloud, Motoyama Station" de Utagawa Kuniyoshi: https://onlinecollections.syr.edu/objects/4006/yamauba-descending-on-a-cloud-motoyama-station

      "Rabbit (U): The Mountain Witch of the Ashigara Mountains (Ashigarayama no Yamauba)" de Utagawa Kuniyoshi: https://onlinecollections.syr.edu/objects/4008/rabbit-u-the-mountain-witch-of-the-ashigara-mountains-as

      "Yamauba and Kintarô" de Kitagawa Utamaro: https://ukiyo-e.org/image/met/DP135608

      Ukiyo por serem baratos era produzidos e vendidos ou alugados com maior facilidade, assim grande parte da sociedade urbana japonesa tiveram acesso as xilogravuras e aos temas presentes nas ilutrações.

      Espero ter te ajudado, qualquer duvida estou a disposição. :)

      Maria Heloisa Andrade Pinheiro

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  6. Amei seu texto Maria Heloísa! Como a mulher que não queria casar no período Edo, não queria 'servir' o homem era retratada como um monstro, como uma bruxa, como algo sobrenatural na sociedade. As que não fugiam para a religião, eram excluídas da sociedade. O patriarcado é muito presente até hoje, e na sociedade japonesa, a mulher que não quer casar, não foge para a vida religiosa, como ela é vista pela sociedade? Ainda existe muito tabu na sociedade japonesa nos tempos atuais, que nos traz a figura de Yamauba? Acredita que a mulher que não quer seguir os padrões da sociedade patriarcal ainda é vista como uma Yamauba?

    Suelen Bonete de Carvalho

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    1. Olá Suellen, obrigada por ler meu texto! <3

      Honestamente, não sei responder sua pergunta diretamente. Como o período que estudo é o Período Edo tenho mais conhecimento sobre ele e sobre os outros períodos antes dele.

      Mas podemos pensar juntas! A sociedade japonesa é patriarcal e esse patriarcado foi ainda mais reforçado com as doutrinas confucionistas e neo-confucionista no Período Edo - e essas doutrinas também contribuíam para justificar o xogunato Tokugawa - assim as mulheres foram limitadas, como apontei no texto. Porém, ao final do período edo, na transição para o período meiji - juntamente com o xogunato as doutrinas citadas acima também perdem influência, e junto com a figura do imperador o xintoísmo e o budismo ganham espaço.

      Dando um salto no tempo e falando sobre o presente, como foi o foco da sua questão, as mulheres japonesas passaram a se dedicarem a sua vida profissional. Se casassem essas, provavelmente, deixariam seus empregos e se dedicariam a família.

      Contudo, acredito que atualmente não existia tal associação - mulheres que não se casam podem ser uma yamauba pela sociedade - pois se comparar o Japão atual com o Japão no período edo existem mais distinções do que semelhanças. O papel das lendas, mitos e contos é outro, a forma de perceber o papel dentro da sociedade também teve suas alterações.

      Sabemos que o patriarcado sempre esta ao redor da figura feminina para ditar normas e padrões, então acredito que haja dificuldades e preconceitos em torno das mulheres japonesas atualmente independente das suas decisões. Porém, não posso afirmar que existe uma ligação - significativa ou não - entre essas mulheres e a yamauba.

      Espero ter te ajudado, qualquer duvida estou a disposição! <3

      Maria Heloisa Andrade Pinheiro

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