NO RASTRO DAS POETISAS ESQUECIDAS – EM BUSCA DA CULTURA ESCRITA DAS CORTESÃS (YŪJO) DO JAPÃO PRÉ-MODERNO
Introdução
Durante o período
Edo, as cortesãs ou yūjo (遊女), como assim eram chamadas, foram
exaustivamente representadas em diversas obras literárias, roteiros de peças
teatrais e em pinturas ukiyo-e (浮世絵). Dentre as pinturas ukiyo-e, há centenas delas
retratando as yūjo envolvidas em atividades como leitura de livros,
escrita de cartas e composição de poemas.
A troca de cartas com os clientes constituía uma parte importante do ritual dos bairros dos prazeres e, embora um homem não devesse escrever a uma cortesã até que ela lhe escrevesse primeiro, como parte de suas habilidades comerciais, uma cortesã deveria ser capaz de escrever de maneira bela e adequada para reter os melhores clientes. Em Shikidō ōkagami (色道大鏡), do autor Fujimoto Kizan, que passou cerca de 30 anos pesquisando exaustivamente sobre os bairros dos prazeres, encontramos a seguinte declaração: “É lastimável que uma pessoa não saiba escrever, mas para uma cortesã, é um desastre!” Além de ser um guia completo sobre etiqueta e como se comportar dentro dos bairros dos prazeres, Shikidō ōkagami (色道大鏡), também nos traz alguns fatos interessantes sobre a alfabetização das yūjo (遊女). O capítulo 9, intitulado Bunshou no bu (文章の部), consiste em uma seção dedicada a reforçar importância das habilidades de escrita de um yūjo, além de ser uma ferramenta útil para compreender como se deu a educação das mesmas. Nas primeiras linhas deste capítulo, Fujimoto afirma o seguinte: “É uma lástima que alguém não saiba escrever, mas para uma cortesã é um desastre. Desde que uma cortesã escreva bem, não importa se ela é incompetente no shamisen Porém, mesmo para um virtuoso do shamisen seria lamentável se as pessoas dissessem que ele escreve mal ou que sua gramática é instável”.
No mundo do ukiyo-e não é diferente. Existem inúmeras obras de
ukiyo-e que retratam yūjo (遊女) escrevendo cartas ou
lendo livros. Um bom exemplo seria Ehon seiro bijin awase (絵本青楼美人合), de Suzuki Harunobu, onde 166 cortesãs dos bairros de prazer de Yoshiwara
são retratadas com haikais supostamente compostos por elas.
Itasaka (2010, p.87-108) comenta que durante meados do período Edo é que as
cortesãs comneçam a predominar entre as mulheres leitoras retratadas em ukiyo-e,
substituindo as mulheres de famílias aristocráticas do período pré-moderno, as
quais agora, raramente, eram encontradas.
Diante de tais fatos, surgem alguns
questionamentos: 1) Como se dava a instrução e treinamento de uma yūjo? 2) Se os mestres do ukiyo-e eram tão
obcecados em representar cortesãs lendo e escrevendo, seria este um indicativo
de que elas deixaram algum material escrito? 3) Caso este material exista, de
que maneira nos ajudaria a compreender a história das cortesãs e sua persona?
Munida com estes três questionamentos, iniciei uma busca pelas obras
escritas deixadas pelas cortesãs do Japão pré-moderno. Esta busca me levou até os arquivos digitais de biliotecas japonesas,
onde obtive resultados satisfatórios para a fase introdutória de minha
pesquisa. Pesquisa esta, que visa contribuir com os estudos existentes sobre a
produção literária e historiografia das mulheres do período Edo, como uma
tentativa de resgatar as obras deixadas por elas, que com suas habilidades
artísticas alavancaram o lucro dos bairros dos prazeres e enriqueceram os donos
dos bordéis. Mulheres estas, que tiveram um papel crucial na economia e cultura
do período Edo, mas cujas obras receberam pouca ou nenhuma atenção da academia
até o momento.
1.
Quem eram as yūjo?
Não se tem certeza de como o
termo yūjo surgiu, mas
ele já era citado em crônicas e relatos do Japão antigo. Segundo Seigle (p. 4),
Oe no Masafusa (1041-1111) um reconhecido estudioso e aristocrata, descreveu em
seu Yūjoki (Registros de cortesãs) as prostitutas que ele havia
encontrado. Yūjoki remonta ao
final do sec. XI (1087-1094) e foi escrito em kanbun, como era o costume
entre a elite masculina da época.
Entretanto, a cultura das cortesãs como se tem conhecimento hoje,
floresceu de fato, durante o período Edo, quando foi criado o bairro dos
prazeres.
Com a legalização dos bairros dos
prazeres por todo o Japão, sendo os principais nas províncias de Osaka, Kyoto e
Edo (atual Tóquio), muitas prostitutas migraram para estes bairros. Porém, por
fora, acontecia outro sistema: o de recrutamento de meninas para trabalhar nas
zonas autorizadas. Agentes contratados pelos bordéis percorriam diversas
províncias em busca de meninas que futuramente trariam grande lucro aos
bordéis. Estas meninas vinham de famílias pobres e o trato era o seguinte: o
agente visitava a família, falava do interesse na menina, oferecia uma quantia
de dinheiro e assim, ela era vendida.
Para a maioria das famílias não
abastadas, ter uma menina era um fardo, pois ela certamente não contribuiria
financeiramente com a família e eles teriam que alimentá-la até que ela se
casasse e se mudasse para a casa da família do marido, como prescrevia a
tradição da época. Entretanto, vender uma filha não era visto pela sociedade da
época como um crime grave ou algo cruel, diferente de nossa visão
contemporânea,. Isto se deve ao fato de que a sociedade japonesa do período Edo
era baseada em conceitos neo-confucionistas. Dentre eles,
estava o importante conceito de piedade filial (chinês: 孝 xiào). Este
conceito de sacrificar-se pelos pais era visto como uma grande virtude e as
filhas que o faziam, ainda que fossem vender seus corpos, eram vistas com muita
admiração pela família e pela sociedade como um todo. A piedade filial era tão
importante que o xogunato criou o kankoku kōgiroku (Registro
Oficial de Piedade Filial), uma lista de indivíduos em todo o país que foram
elogiados pela piedade filial desde a fundação do regime e recebaim um prêmio
por isto. Os premiados eram majoritariamente homens, mas as mulheres também
foram elogiadas, sendo a grande maioria na categoria “piedade filial” ou
“castidade” (Yonemoto, 2016, p. 23).
As futuras yūjo que foram
vendidas por suas famílias chegavam aos bordéis quando ainda tinham 7 ou 8 anos
de idade e tinham sua estreia como cortesãs por volta dos 14 ou 15 anos. Dentro
dos bordéis onde iriam trabalhar, elas recebiam treinamento em diversas artes:
caligrafia, poesia clássica, shamisen, dança
tradicional, etc. Havia uma rígida hierarquia dentro destes bordéis e poucas
chegavam ao sonhado título de Tayū (太夫), o mais alto patamar que uma cortesã poderia
alcançar. Além de uma beleza física estonteante, ela deveria ser uma exímia
artista, realizando com perfeição todas as habilidades artísticas aprendidas
durante seus anos de treinamento. Ela também era a única que poderia recusar um
cliente. Para encontrar-se com uma cortesã deste calibre, era preciso gastar
uma quantia exorbitante de dinheiro. E por isso, somente aristocratas e homens
de alta patente conseguiam tal feito. As demais cortesãs, cada uma tinha um
título o qual lhe atribuía algumas vantagens. Abaixo das Tayū, mas
também consideradas cortesãs de alta patente estavam as tenjin (天神) e kōshi (格子). Cheias de estilo, elas influenciavam a moda e a
etiqueta da época. Entretanto, a vida
dessas meninas era muito dura e sem perspectiva de futuro. Sua dívida com o
bordel só aumentaria à medida que ela subisse na hierarquia, já que seu
guarda-roupa luxuoso e em constante mudança, exigia até quatro ou cinco camadas
de quimonos usados de cada vez, além de gorjetas e honorários para seus
atendentes. Forçadas a trabalhar muitas horas mesmo quando estavam doentes ou
menstruadas, as mulheres destes bairros dos prazeres tinham que cumprir uma
cota diária ou seriam multadas. Independente da patente dentro do bordel, a
maioria delas sofria de doenças venéreas e passava por verdadeiras sessões de
tortura como práticas abortivas caso engravidassem. Muitas acabavam falecendo
antes de completar trinta anos de idade. Outras, davam
a luz dentro do bordel e a a criança, já nascia com o destino traçado,
principalmente se fosse menina.
2.
Educando cortesãs
Para analisarmos como as yūjo
se tornavam exímias escritoras e poetisas, é necessário considerar a maneira
como elas chegavam até os bairros dos prazeres. Dentre as yūjo
pesquisadas neste trabalho, há algumas que chegaram no bairro dos prazeres já
em idade adulta, oriundas de famílias de samurais que foram à falência ou
vítimas de alguma calamidade. Estas, já chegavam em Yoshiwara, Shimabara e
Shinmachi com um alto nível de educação, como era esperado das filhas de
famílias de samurais da época. Um exemplo disso, é a cortesã Ohashi, cujo nome
original era Tsu (津). Ohashi era
filha de um samurai de Edo que tornou-se um ronin e por isso, mudaram-se
para Kyoto. Como Ohashi já tinha sido instruída em poesia waka desde
jovem e possuía diversos atributos artísticos, logo tornou-se um dos nomes mais
conhecidos e requisitados no bairro dos prazeres de Shimabara. Segundo Shiba
(2016, p.826), Ohashi foi discípula da família Reizei, um dos descendentes do
clã Fujiwara e com uma longa tradição em poesia clássica. Entretanto, como é de
conhecimento geral, grande parte das yūjo chegavam aos bairros dos prazeres com
sete ou oito anos de idade, oriundas de famílias pobres ou nascidas nos
próprios bordéis onde suas mães trabalhavam. Levando este fato em consideração,
podemos especular que dificilmente estas meninas possuíam algum nível de
instrução antes de chegar aos bairros. Outro fato relevante a ser observado, é
que a maioria das meninas e moças não tinham liberdade para sair a hora que
quisessem, pois seguiam uma rotina exaustiva e de total controle por parte de
seus chefes. A vida delas acontecia dentro dos bairros e do bordel ao qual
pertenciam. Portanto, uma vez que não tenhamos fontes fidedignas para nos
provar o contrário, é difícil imaginar que elas frequentassem algum tipo de
escola fora do local onde moravam.
Sendo assim, onde acontecia a
educação e treinamento destas meninas? Apesar de não termos fontes concretas
sobre como esta educação acontecia, há algumas evidências que nos ajudam em
nossa especulação. Uma delas, é a Yoshiwara no suzume, de 1667, onde há
uma passagem que menciona que os gestores de bordéis não devem medir esforço no
que diz respeito às meninas criadas como aprendizes (kamuro), além de mencionar
que elas deveriam ter familiaridade com poesia clássica e obras como Ise
Monogatari. Em Edo Ki Onna Hyogensha Jiten
(2016), encontramos mais algumas pistas que nos levam mais próximo de
compreender como acontecia a educação destas mulheres.
Cortesãs Nome do bordel Mestres Habilidades Artísticas
Takigawa 5ª
geração Shin Yoshiwara-Gomeiro Kato Chikage Caligrafia japonesa
Hanaogi 2ª
geração S. Yoshiwara-Gomeiro Sawada Toko Caligrafia japonesa
&
Kadano Tamiko Poesia
clássica (waka)
Hanaogi 4ª
geração S. Yoshiwara-Gomeiro Toko Genrin Caligrafia chinesa
&
Kato Chikage
Caligrafia japonesa
Sakuragi Shimabara – Wachigaya Nose Haruomi & Poesia clássica (waka)
Otagaki
Rengetsu
Hamaogi Shimabara- Nanbaya Matsunaga Teitoku Haikai
Eram todas as cortesãs excelentes
escritoras e poetisas? Certamente não. Segundo Watanuki (2014, p.163),
provavelmente cortesãs que acabaram de ser vendidas aos bordéis e cujo tempo de
aprendizado ainda era curto, certamente não conseguiam escrever bem ainda. E,
havia outras que mesmo recebendo treinamento, não eram capazes de produzir uma
carta bem escrita.
3.
Nos rastros da escrita das cortesãs
A busca nos arquivos por algo escrito pelas cortesãs, me levou à cartas,
poemas de vários estilos (waka, haikai, kyoka) e a surpreendente
descoberta de que muitos dos seus poemas fazem partes de antologias do período
Edo, sendo selecionados por nomes como Yosa buson, por exemplo. Esta
busca também me revelou a existência dos círculos literários nos bairros dos
prazeres, nos quais donos de bordéis e as yūjo participavam lado a lado
com outros grandes nomes da poesia da época. Embora esta pesquisa ainda esteja
na fase inicial, até o momento foram compilados cerca de 185 poemas, sendo 135
de Yoshiwara e 50 dos bairros de Shimabara e Shinmachi. Há fontes que não estão
disponibilizadas online e por este motivo, será necessário uma visita ao
arquivos onde se encontram estas fontes para que possamos selecionar os poemas
desejados e transcrevê-los em nossa lista. Os arquivos também nos provam que os
mestres do ukiyo-e ao retratar as cortesãs escrevendo, lendo ou compondo
poesia, não estavam trazendo o mundo imaginário para a realidade como
acreditava Kornicki (2010, p.13). Mas até mesmo Kornick afirma que ainda que
muitas das imagens das cortesãs com livros possam representar uma idealização,
tal conexão é tão difundida na representação visual, mesmo no sec. XVII, que
fica difícil descartá-la de imediato. Com estas informações e materiais
oriundos dos arquivos, as duas perguntas apresentadas na fase introdutória
deste artigo, já foram parcialmente respondidas. Entretanto, para chegarmos à
resposta do terceiro questionamento (Como material escrito pelas cortesãs nos
ajudaria a compreender sua própria história e sua persona?), teremos que
analisar os poemas encontrados até o momento e fazer um recorte por época ou
tema, etapa na qual a pesquisa se encontra neste momento.
O fenômeno das cortesãs com grande
habilidades literárias e artísticas, não é privilégio do Japão. Nos anos finais
da Dinastia Ming, como observado por Ropp (1993, p.113), a cultura das cortesãs
desempenhava um papel importante na produção literária e na habilidade de
compor poesia, além das habilidades de pintura, caligrafia e música, pois estas
eram habilidade que uma mulher da aristocracia deveria possuir.
Na mesma época em que as cortesãs do período
Edo floresceram com sua arte, no império Mughal (ou Mogol), na Índia, as
cortesãs, conhecidas como Tawaif, também passavam por um rígido treinamento e
as melhores cortesãs, deveriam ser excelentes nas 64 habilidades artísticas
descritas por Vātsyāyana em seu livro Kama Sutra, que incluíam: canto,
dança, poesia, caligrafia, costura, fabricação de fragrâncias, etc.
Apesar de cada império ou dinastia ter sua
cultura de cortesãs com suas próprias peculiaridades, há inúmeras semelhanças
que conectam as cortesãs do Japão, China e Índia.
Uma pesquisa comparativa e detalhada sobre as cortesãs destes países e sua escrita é certamente, o próximo objetivo desta pesquisa nos próximos anos.
Referências
Possui graduação em Abi - Letras - Português - Japonês pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2006). Desde junho de 2021, professora substituta de língua, cultura e literatura japonesa no Departamento de Letras Orientais e Eslavas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
FUJIMOTO, K.; NOMA, K. Shikidō
ōkagami. Tokyo: Yagi Shoten, 1974.
IBUCHI, R. Yujo no Bungaku. Tokyo:Tatsubunkan,
1913.
KORNICKI, P.F.; PATESSIO, M.; ROWLEY,
G. G. The Female as Subject. University of Michigan Press, pp.1-59, pp.
60-87, 2010.
ROPP, P. S. Love, literacy, and
laments: themes of women writers in late imperial China. Women’s
History Review, v. 2, n. 1, p. 107–141, mar. 1993.
SEIGLE, C.S. Yoshiwara: the
glittering world of the Japanese courtesan. Honolulu: University Of Hawaii
Press, 1993.
SHIBA, K. Edo Ki Onna Hyogensha
Jiten. Tokyo: Katsura Bunko, 2015.
SUZUKI, H. Ehon seirō bijin
awase. Tokyo: Edo Rekishi Library, 2021.
VĀTSYĀYANA; UPADHYAYA, S. C. The
kama sutra: the Hindu art of love. London: Watkins, 2004.
WATANUKI, T. Edo no Koibumi –
Iiyoru, Kudoku, Mono no suru. Tokyo: Heibonsha Shinsho, 2014.
YONEMOTO, M. The Problem of
Women in Early Modern Japan. Univ of California Press, 2016.
Ola Juliana! Tenho muito interesse pelo seu tema de pesquisa e é sempre um prazer ver os caminhos que você tem seguido com ele.
ResponderExcluirTenho uma questão que pode ser mais básica, mas que me surgiu. Concretamente queria saber se você consegue me explicar a estrutura desses bordéis. Isto é, quem eram, normalmente, os donos dessas instalações, quem lucrava com a exploração dessas mulheres?
Há uma argumentação sobre a escrita feminina em Heian que aponta pra como os homens aristocratas de então, numa lógica específica de "propriedade", operacionalizavam a produção literária das mulheres enquanto "moeda de troca" entre outros homens na corte. Nisso, me ocorreu que talvez haja alguma semelhança com a condição da yujô em Edo. Quero dizer, em Heian as mulheres da aristocracia eram segregadas espacialmente e se comunicavam, majoritariamente, por cartas com o sexo oposto. Cartas que envolviam a composição de Waka etc. ter o domínio dessa técnica era, então, uma forma de se envolver no traquejo social da época, como também parece ser o caso das yujô. Fico pensando se a forma como esse costume se instaurou não tem uma origem nessa prática aristocrática tal qual o utanorenga aristocrático deu no haikainorenga de uso mais "popular" em Edo etc. São só algumas sensações que tive durante a leitura do seu texto, se você tiver algum comentários sobre, ia ficar bem contente em ler!
Felipe Chaves Gonçalves Pinto
Felipe sensei, obrigada pelo comentário! Respondendo às suas perguntas: 1. Os bordéis atuavam dentro do "bairro dos prazeres", nas zonas autorizadas, seja Kyoto, Osaka ou Edo. Estes bordéis tinham um nome e eram administrados pelo dono da casa e sua esposa. Geralmente tanto o dono como sua família moravam dentro do bordel. Porém, havia um espaço definido para cada coisa. O bordel e os bairros dos prazeres movimentavam muitos empregos, sobretudo entre as castas mais baixas. Em relação a quem eram exatamente os donos dos bordéis, é uma ótima pergunta e eu preciso pesquisar mais para te responder. Porém, eles eram também patronos das artes, sobretudo do Kabuki, além de possuirem alto grau de instrução, pois eles treinavam as cortesãs em artes e no traquejo social para lidar com clientes da aristocracia da época. 2. Em relação a origem deste costume de escrita de cartas e poesias, certamente vem do período Heian e, as cortesãs também estudavam os grandes clássicos escritos naquele período, como Genji Monogatari e Ise monogatari. Esse conhecimento da literatura clássica japonesa era requisito básico para uma cortesã e também para as mulheres da aristocracia da época. Obrigada pelas perguntas!
ExcluirOlá Juliana! Sua pesquisa é incrível e já estou ansiosa para ler sobre as outras fases dela.
ResponderExcluirMeu questionamento é sobre as yujo, elas também acabavam se endividando com o passar do tempo de trabalho nos bordeis? Outra questão é: quem ainda não ler em japonês, como posso ter acesso a essa discussão ? Tem algum livro em inglês que você me indicaria?
Obrigada pelo comentário, M. Heloisa! Fico feliz que tenha gostado do tema. Respondendo sua pergunta, sim, era muito comum que elas se endividassem, sobretudo as de patente mais alta, pois eram responsáveis por suas vestimentas, acessórios e por tudo o que envolvia as Kamuro, que eram as ajudantes. Muitas continuavam endividadas mesmo após o término do contrato com o bordel e aí, continuavam trabalhando lá na mesma posição ou em uma posição inferior, devido a idade. Poucas conseguiam realizar o sonho de serem regastadas por algum pretendente rico que comprasse seu dote. Em relação ao idioma de pesquisa, há alguns livros bons em inglês. Para começar, eu sugiro o SEIGLE, C.S. Yoshiwara: the glittering world of the Japanese courtesan. Honolulu: University Of Hawaii Press, 1993 e um mais atual, que fala do comércio por trás destas mulheres: Selling Women: Prostitution, Markets, and the Household in Early Modern Japan, de Amy Stanley, de 2012.
ExcluirObrigada, Juliana!
ExcluirPessoal do evento esqueci de assinar meu nome completo na pergunta :(
Maria Heloisa Andrade Pinheiro
De nada! Foi um prazer!
ExcluirCara Juliana, que texto interessante e agradável! Por favor, eu gostaria que você falasse mais sobre a interface entre as cortesãs e o Livro do Travesseiro, se esse espaço o permitir.
ResponderExcluirObrigado,
Rafael Shuji
Olá, Rafael! Muito obrigada pelo comentário. Para fazer um recorte das cortesãs e do Livro do Travesseiro, eu teria que fazer uma pesquisa à parte (ótimo tema, aliás!). Só fazendo um pequeno esclarecimento antes de responder sua pergunta: em muitas traduções em inglês, nós encontramos a descrição da Sei Shonagon como "courtesan", mas simplesmente por ela ser nobre, pertencente à corte. Este mesmo termo cortesã, não se aplica às cortesãs do meu texto. Até onde me lembro, o Livro do Travesseiro não menciona cortesãs/prostitutas (yujo, yūkun, etc.), mas preciso verificar para te passar esta informação com precisão. Entretanto, se pensarmos no período Heian, há vários livros que mencionam prostitutas, como o próprio Contos de Genji, no capítulo 14, onde há escrito "mulheres de prazer" (não sei como está na versão em português). Elas costumavam abordar os homens em pequenas embarcações e ofereciam seus serviços. Nesta época, a prostituição no Japão não era autorizada pelo governo e não acontecia em um lugar determinado, como passou a ser na época das yujo. E, o termo yujo como cortesã ou prostituta, é mais específico do período Edo. Antes disso, haviam diversos outros nomes para designá-las. Espero que eu tenha respondido sua pergunta. Obrigada!
ExcluirOlá, Juliana. Parabéns pelo seu texto e, principalmente, pela sua pesquisa de resgate dessa literatura.
ResponderExcluirO seu trabalho me fez recordar uma coleção de dois livros que saiu em Portugal, há alguns anos atrás. Chama-se "O Japão no Feminino", e reúne poemas (se não me falha a memória são tanka no vol. 1 e haiku no vol. 2) de autoria feminina ao longo da história japonesa. Após ler seu texto, fiquei pensando que ali provavelmente devem ter poemas de cortesãs do período Edo e que não sei se foram identificadas como tais. Caso não estejam, só aumenta a relevância do estudo que você está desenvolvendo.
Bem, gostaria de perguntar se você acha que as cortesãs (ou mesmo mulheres não-cortesãs do período Edo) podem ter transitado por outros gêneros textuais. Quero dizer, dentro dos outros gêneros do período Edo, como os yomihon ou os ukiyo-zoshi ou mesmo peças de teatro (que a historiografia literária só aponta autoria masculina), você acha que há textos de autoria feminina? Há algo em sua pesquisa que já apontou para essa direção?
Parabéns mais uma vez pelo trabalho.
José Carvalho Vanzelli
Olá, José! Muito obrigada pela sua pergunta. Obrigada pela recomendação do livro O Japão no Feminino. Não conhecia, mas fui procurar mais informações e descobri que no volume 2, de haiku, são 20 autoras. Posso estar enganada, mas acredito que não tenha nenhuma cortesã no meio, pois elas não aparecem nem em dicionários japoneses especializados em literatura de autoria feminina. E como as cortesãs (yujo) não podiam usar um pseudônimo e tinham que publicar com o nome pelo qual eram conhecidas dentro dos bairros dos prazeres, seria fácil identificá-las em qualquer livro. Em relação a sua pergunta, a resposta é sim. Com certeza transitaram e muito! Há cortesãs que compunham até kanshi (poesia clássica chinesa), além de terem deixado alguns trabalhos de caligrafia, também. Até onde pesquisei, há alguns ukiyo-zoshi que foram escritos em parceria com cortesãs (yujo), mas cuja autoria é totalmente masculina. Em relação a peças de teatro, não tenho evidências, mas não duvidaria, viu? Minha pesquisa ainda está na fase inicial e creio que há muito o que descobrir. Mais uma vez, obrigada pelos apontamentos.
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