A INFLUÊNCIA DE ROBERTO DE NOBILI PARA O DESENVOLVIMENTO DAS MISSÕES NA PROVÍNCIA JESUÍTICA DO MALABAR (ÍNDIA, SÉCULO XVII)
A Querela dos Ritos Malabares foi um
amplo e complexo debate entre grande parte da Igreja Católica, especialmente no
interior da Companhia de Jesus, que dizia respeito sobre a possibilidade da
perpetuação de certos costumes pelas populações nativas da Índia após a
conversão, tais como as distinções de casta, por exemplo. Além disso, a querela
também discutiu sobre a viabilidade do uso de certos elementos das culturas
locais por parte dos missionários, a fim de conseguirem driblar as barreiras
impostas pela organização em castas (Cabús, 2024).
O ponto central da querela se desenvolveu a
partir do projeto missionário de Roberto Nobili, que foi pensado com intuito de
buscar superar a dificuldade em converter os hindus de casta alta, tangenciando
o problema com a adoção de uma estratégia missionária a partir de um estilo
propriamente indiano através do modo de se vestir, da adoção de formas
linguísticas e das práticas sociais e rituais cotidianas. Os membros das castas
mais altas passaram a associar os missionários, sobretudo os portugueses, a uma
categoria conhecida como parangui. Sendo
os paranguis classificados como
intocáveis, os missionários eram impossibilitados de contactar um brâmane, sob
o risco deste perder o prestígio de sua casta. Para que a construção desta
estratégia, que foi conhecida como accomodatio fosse possível, o jesuíta
italiano, através da consulta de um mestre brâmane, abandonou o hábito
jesuítico, adotou a dieta vegetariana e a técnica de meditação e, além de tudo,
aprofundou-se no conhecimento erudito das línguas tâmil e sânscrito, buscando
acesso aos textos sagrados dos brâmanes (Agnolin, 2020).
A praxe da accomodatio
promovida pela evangelização jesuítica se encontrou no centro das atenções das
congregações romanas. Seja pela maneira de enfrentar o problema ou pela
alternância de propostas sugeridas, sustentadas ou condenadas, estas tensões
evidenciam que nas novas missões a Sé papal estava à frente de um dilema
fundamental: o favorecimento de um número mais consistente de conversões, em
alternativa à permanência de uma rígida ortodoxia que considerava qualquer
representação de tradições locais como idolatria. Foi a necessidade de
conciliar estes dois planos, favorecer a consistência das conversões sem
renunciar à salvaguarda da ortodoxia, que ajuda a compreender as dimensões e
extensão do debate desencadeado por Nobili e seus opositores (AGNOLIN, 2020).
A Querela dos Ritos Malabares teve
repercussões extracontinentais que protagonizaram um dos maiores enfrentamentos
de toda história da Companhia de Jesus. Suas dimensões foram tamanhas a ponto
de Inês Županov considerar que a dita querela fora responsável pelo início do
enfraquecimento da organização jesuítica, sendo um dos fatores causadores do
longo processo de desmonte da Ordem que se daria no século XVIII (ŽUPANOV,
1999).
A respeito da contextualização
histórica voltada para compreensão da Querela dos Ritos Malabares, podemos
partir do ano de 1615, quando é nítida uma mudança no âmbito das missões
jesuíticas na Ásia. Isso ocorreu devido à morte do Geral da Companhia, Claudio
Aquaviva, estando à frente da instituição desde 1581. O jesuíta Muzio
Vitelleschi, apontado por autores como Adone Agnolin como um antigo mestre de
Roberto de Nobili, sucede Aquaviva no posto de Geral da Companhia de Jesus.
Isso significa um quase imediato melhoramento da condição de Nobili e ua
estratégia, o que pode ser evidenciado com a aprovação dos teólogos romanos de
sua obra em 1616, evidenciada pelo breve papal de Paulo V, Cum sicut Fraternitatis. Tal aprovação abre espaço para que Roberto
de Nobili voltasse a atuar na Província do Malabar, tendo como base sua
estratégia, principalmente devido à retirada das acusações de heresia contra o
missionário em 1617 (Agnolin, 2020, p. 229–232).
Embora bastante favorável, tais movimentações
não significavam uma resolução por completo do conflito. Podemos observar isso
através da figura do Primaz de Goa, cuja nomeação data de 1615, Cristóvão de Sá
e Lisboa, um dos maiores opositores de Nobili e responsável por ações que
repercutiam na Companhia como um todo, recebendo apoio dos franciscanos e
dominicanos. Nesse sentido, ao acionar o Inquisidor de Lisboa, Fernão Martins
de Mascarenhas, contra Nobili, Cristóvão de Sá reavivou a polêmica. Embora o
inquisidor tenha tido papel mediador ao informar Cristóvão de Sá sobre a
necessidade de respeitar as deliberações vindas de Roma, ele recomendou que
fossem feitas averiguações mais detalhadas sobre as ações missionárias de
Nobili. Entretanto, as movimentações em torno da polêmica não chegaram a
apresentar riscos reais à perpetuação da accomodatio
no Malabar (Agnolin, 2020, p. 229–232).
A conferência em Goa, convocada por seu
primaz, Cristóvão de Sá, e marcada para 1619, teve como objetivo principal
questionar a validade da práxis da accomodatio.
Desta maneira, Roberto de Nobili foi convocado a se fazer presente na
conferência e o resultado de tal convocação foi a confecção de sua primeira Narratio, tendo como ponto principal os
fundamentos da abordagem através da accomodatio.
Nesse sentido, o concílio fecha em impasse entre os dois inquisidores
presentes, sendo necessário o envio dos documentos à Inquisição de Lisboa, para
que fossem posteriormente encaminhados à Roma (Agnolin, 2020, p. 189).
Recebidos os documentos pela Propaganda
Fide, Francesco Ingoli, seu secretário, tinha como posicionamento o
encerramento do caso do Madurai, decretando, em Roma, a conclusão favorável a
Nobili. Contudo, permaneceria em aberto o debate sobre a validade dos usos de
sinais protestativos das seitas gentílicas por parte dos convertidos, sendo
ainda objeto de contestações (Agnolin, 2020, p. 195).
O ano de 1621 é um ponto importante no
interior da Querela. Ele é marcado pelo falecimento de três de seus
protagonistas: o Primaz de Goa, Cristóvão de Sá e Lisboa; o rival de Nobili,
Gonçalo Fernandes Trancoso e o Papa Paulo V. O pontífice que sucede este
último, Gregório XV, ao criar a Comissão Romana, buscou de maneira incisiva
encerrar a Querela dos Ritos. Tendo uma composição bastante heterogênea,
formada por um carmelita, um beneditino e pelo Primaz da Irlanda, a Comissão
Romana teve o objetivo de julgar de maneira definitiva a controvérsia. Ainda em
1621, o Inquisidor de Lisboa encaminhou um parecer favorável a Nobili,
resultando em um pronunciamento por parte da Comissão a favor do italiano.
Nesse sentido, a constituição da bula Romanae
Sedis Antistes, datada de 1623, coloca um ponto final no que Agnolin
apontou como primeira grande fase do confronto. Sustentamos tal afirmativa
porque Nobili foi absolvido das acusações de heresia e autorizado, agora de
maneira formal, a continuar sua missão a partir da estratégia de accomodatio (Agnolin, 2020, p. 231).
Nesse sentido, fica evidente que Nobili saiu como vencedor
do conflito, pois com o apoio recebido por parte de Roma, o italiano pode se
consolidar no contexto missionário indiano, exercendo sua autoridade com base
no método missionário. Nesse viés, Roberto de Nobili exerceu sua missão
dirigindo-se aos territórios do Misore e Ceilão, desta forma, rompendo as
fronteiras do Malabar. De certa maneira, consolidou evidentemente a abordagem acomodativa
ao se tornar superior da missão do Madurai entre os intervalos de 1624–1632 e
1638–1643, encerrando suas atividades com sua morte em 1656 no território de
Meliapor (Agnolin, 2020, p. 231).
A mudança de postura do clero foi grande a
respeito do uso da estratégia de accomodatio.
Podemos observar a princípio a partir de um tópico reservado exclusivamente na
biografia de João de Brito, jesuíta português que atuou na missão do Madurai
entre os anos de 1684 e 1693 a partir de um modelo muito similar ao de Nobili,
retirado de um documento datado de 1691, no qual Brito, apesar de missionar de
maneira diferente de Roberto de Nobili, aborda sobre a grande aceitação do uso
da accomodatio. Intitulado De como os Padres da Companhia de Jesus
seguiram o exemplo do P. Roberto Nobili, e o modo que observam na conversão
d’aquella gentilidade, o tópico inicia com:
“Como a experiencia que o estylo que seguira o P.
Roberto Nobili, era o mais conveniente,
e eficaz para insistir na conversão da gentilidade de Madurei, resolveram-se
muitos dos padres da Companhia de Jesus da província do Malabar a seguir o
mesmo estylo, e assim, depois de aprenderem com toda a diligencia a lingua,
entraram n’aquelle reino com este disfarce, obrigando-se aos rigores, que elle
pede: e os effeitos teem mostrado que
foi resolução do Ceu; porque não só pregam estes missionarios no reino de
Madurei, mas tambem no de Tanjaor, no de Ginja, e no de Velur: e são já os
convertido á nossa fé muitos mais de cem mil.” (Britto, 1852, p. 40–42).
Pela citação evidenciada podemos observar
claramente que a abordagem de Nobili não somente era utilizada amplamente, como
era tida como exemplo de estratégia missionária altamente eficaz, estendendo-se
para regiões para além das fronteiras do Madurai, como Ginja. Além desta
referência, podemos encontrar menção à estratégia de accomodatio na carta ânua de 1683, escrita por João de Brito,
quando abordado sobre os tratos dos gentios que se recusavam a estar na
presença de um europeu (parangui):
“Tendo noticia clara de todos estes
abusos o grnde servo de Deos, é exemplo de Missionario o Pe. Roberto Nobili de
Santa memoria; conhecendo com Santo Ambrozio, que, […] pª. Evitar a cauza que estes gentios davão de senão converter: [...], mudou os trajos de Europeo, e se
pôz os de Bramane Saniaz, que hê o mais grave, que hâ nestas terras,
vivendo no mais interior do sertão delas e servindo com Bramenes, dizendo ser
elle Bramane Saniaz Romano, que val o mesmo que Religioso sciente de Roma.”
O documento prossegue afirmando que conforme
“os costumes políticos da terra”, Nobili evitava quaisquer contatos com
europeus, mas que isso valia a pena tendo em vista o grande número de
conversões que este disfarce o possibilitou. Ainda segundo a ânua, Nobili teria
assim aberto um espaço para a conversão no reino do Malabar que estaria fechado
há muitos séculos.
A influência de Roberto de Nobili
foi gigantesca no contexto das missões do Malabar. Encontramos menções em uma
ânua de 1686 referentes à missão do Madurai ser uma das mais celebradas pela
Companhia e que foi, de certa maneira, iniciada por Roberto de Nobili:
“A missão de Madure he huma das mais
gloriosas que ho tem a Companhia. Plantoua aquelle Apostolico Varão o Padre
Roberto Nobilli, Italianno de Nasção Illustre por sangue, pois teve por Tio o
Cardeal Belarmino, mas muito mais esclarecido por seo Zelo, pois foy o primeiro
q disfarçado em traje de Bragmene abrio esta Missão, cujo modo de vida, e
exemplo forão seguindo athe o tempo prezente
mais de 40 sugeitos da Companhia vestidos como Ioguez, e Pandaràz, que
são tidos daqueles gentios por homens desprezadores do Mundo, e penitentes para
cõ mayor facilidade meterem naqueles espesos matos do gentillismo a ley da fé.”
A ideia aqui evidenciada, pensada
primeiramente por Adone Agnolin, de que Nobili teria vencido a primeira grande
parte da Querela dos Ritos, coloca-se como clara, uma vez que podemos
considerar que as fontes usadas foram redigidas por jesuítas que defenderam a
abordagem de Nobili. Nesse sentido, tais fontes enaltecem Nobili ao adotar este
tom de entusiasmo sobre os resultados de sua metodologia, como é possível
observar em O Illustre Certame:
“Assim pois o P. Nobili percebida
toda difficuldade d’esta empresa, a tomou sobre seus hombros com animo sobejo.
Investigou cuidadosamente todas as historias, os ritos, as leis, a religião, as
fabulas e ficções d’aquella gentilidade. Despiu quanto pôde o homem europeu, e
tomou o traje e os costumes dos indigenas. E primeiramente imitou no exterior
os rajás que têem grande reputação entre os indios: porés desta indústria nada
aproveitou para a conversão das almas. [...] Todavia, como era grandes ânimos,
sem embargo de soffrer duas repulsas, e do traje brahmene secular passando-se
para o religioso, vestiu-se de saniás penitente. [...] Com este methodo de
vida, ganhou finalmente o P. Roberto muito brahmenes para Christo; que tanto
importa levar por diante com alentados ânimos aquillo que uma vez se tomou por
empresa.” (Britto, 1852, p. 288).
Como já mencionamos, Nobili faleceu
em 1656 em Meliapor e ainda assim, é surpreendente encontrarmos documentos que
afirmavam a sua importância na região da Província Jesuítica do Malabar trinta
e cinco anos após a sua morte. Mais surpreendente ainda é pensarmos que em um relatório
sobre a Missão do Reino do Madurai, datado também de 1691, são listados seis
missionários que atuavam sobre esta jurisdição e com base no modelo de de
Nobili, mas apenas um deles, P. Xavier Burgesi, era italiano.
Referências
Alexandre Cabús é Doutorando em
História pelo Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (PPHR-UFRRJ) e integra o Laboratório de Mundos Ibéricos
(LAMI-UFRRJ).
Fontes:
Archivo Romanum Societatis Iesu (ARSI), Goa 54, fl. 433-456v. Carta Annua da Missão de
Madurey do anno de 1683;
Biblioteca da Ajuda, 51-VIII-40, n.º
II. Miscelânea Ultramarina”, fls.
67. Añua da Missão de Maduré dos Annos de 1684; 85;
Biblioteca da Ajuda, 49-VIII-34, “Jesuítas na Ásia”. Missão do Reino do
Maduré.
BRITTO. Fernão Pereyra de. Historia do nascimento, vida e martyrio do
Beato João de Brito [...]. Lisboa: Typographia de A. S. Monteiro, 1852;
Bibliografia:
AGNOLIN. Adone. O amplexo político dos costumes de um jesuíta brâmane na Índia: A
acomodação de Roberto de’ Nobili em Madurai e a polêmica do Malabar (séc.XVII).
Niterói: Eduff. São Paulo, 2020.
CABÚS,
Alexandre. Um santo brâmane? A atuação performática de João de Brito no
interior da Província Jesuítica do Malabar (1673–1693). 2024. 119 f.
Dissertação (Mestrado em História) — Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro, Seropédica, 2024.
ŽUPANOV. G Inês. Disputed Mission: Jesuit
experiments in brahmanical knowledge in seventeenth century India. New Delhi:
Oxford University Press, 1999.
Prezado Sr. Alexandre Cabus,
ResponderExcluirdesde já gostaria de deixar aqui meus cumprimentos pela comunicação.
Gostaria, igualmente, de fazer duas perguntas:
1) seria possível apontar para outras fontes de época que atestem algum sucesso da empreitada proselitista de De Nobili na Índia, para além das fontes cristãs? Essa pergunta se dá no sentido de que, contemporaneamente, tem havido estudos históricos revisando a retórica do sucesso sobre a conversão empreendida por jesuítas em várias de suas missões pelo mundo, inclusive no Brasil colonial, de modo a salientar a relatividade qualitativa – em termos teológicos e culturais – das conversões quantitativamente levadas a cabo pelos missionários de Ignácio de Loyola;
2) haveria alguma fonte, indício ou até mesmo prova histórica que aponte para alguma experiência equivalente por parte de algum brāhmaṇa saṃnyāsa (“Bramane Saniaz”) de assimilação qualitativa de algo da cultura religiosa cristã de De Nobili, num possível cenário de diálogo inter-religioso historicamente documentado em linhas tanto de reciprocidade cultual quanto filosófica?
Desde já agradeço pela atenção.
Atenciosamente,
Matheus Landau de Carvalho.
Prezado Matheus,
ResponderExcluirMuito obrigado pelas perguntas e pela leitura tão atenta ao texto!
A respeito da primeira pergunta, existem, sim, materiais relevantes, mas não pude trabalhar com tais fontes devido a barreiras geográficas (muitos documentos estão localizados em arquivos indianos) e linguísticas (as fontes estão principalmente em língua tamil). Um dos meus objetivos com a pesquisa atual é me debruçar sobre o estudo das línguas tamil e sânscrito, além de buscar oportunidades para consultar os arquivos locais na Índia. Entretanto, gostaria de destacar os trabalhos da professora Margherita Trento.
Em "Martyrdom, Witnessing, and Social Lineages in the Tamil Country (Seventeenth and Eighteenth Centuries)" (2023) e "Writing Tamil Catholicism: Literature, Persuasion, and Devotion in the Eighteenth Century" (2022), a autora trabalha com fontes produzidas por catequistas formados por jesuítas que se espelharam e defenderam a estratégia de Roberto de Nobili, como João de Brito e Giuseppe Beschi. Já no capítulo "Śivadharma or Bonifacio? Behind the Scenes of the Madurai Mission Controversy (1608–1619)", presente na obra "The Rites Controversies in the Early Modern World" (2018), a autora analisa o caso do catequista brâmane Śivadharma, convertido por Nobili.
Quanto à pergunta sobre o cenário de um possível diálogo inter-religioso, Paolo Aranha, em "Roberto Nobili e il dialogo interreligioso?" (2008), explora essa questão com profundidade e, em linhas gerais, conclui que, ao contrário do que afirma Županov em "Disputed Mission" (1999), a empreitada de Nobili não tinha como objetivo o estabelecimento de um diálogo inter-religioso, mas, sim, a conversão total das populações locais ao catolicismo. Isso derivaria do imaginário de que a experiência cristã mediterrânea seria, para o jesuíta, aplicável ao mundo todo. Ana Paula Sena Gomide, em "Sob um outro olhar" (2014), também aborda essa questão e contesta interpretações que atribuem à estratégia de Nobili alguma pretensão de diálogo religioso.
Contudo, é claro que houve continuidades e manifestações religiosas interessantes, responsáveis pela formação de um "cristianismo tamil". Assim, recomendo, mais uma vez, a leitura de Trento (2023) sobre o caso de Arulanandar (São João de Brito/Red Sand Saint) e, para um panorama mais geral, a obra de Susan Bayly "Saints, Goddesses and Kings" (1990).
Espero ter abordado todas as questões. Mais uma vez, muito obrigado pela atenção.
Alexandre Cabús Moreth Silva
alexandrecabus@ufrrj.br
Prezado Alexandre Cabús, agradeço demais pela resposta e atenção. De fato, quando se trata de Índia, são vários meandros com informações densas que nos exigem cuidado na hermenêutica dos fatos. Vou em busca das fontes citadas. Interessantíssimo esse teu texto, assim como as reflexões históricas que ele nos suscita. Excelente contribuição para o Simpósio deste ano. ;)
ExcluirBoa tarde, achei muito interessante o texto, porém tenho pouco conhecimento sobre o assunto. No Brasil os jesuítas tinham como objetivo impor a religião católica aos indígenas e na Índia, o objetivo era a extinção das castas?
ResponderExcluirPrezada Inês,
ExcluirMuito obrigado pelo comentário! Sua pergunta é muito interessante.
De maneira precisa, podemos afirmar que o objetivo primordial das missões jesuítas na Índia era cristianizar toda a população. Entretanto, desde muito cedo, jesuítas como Henrique Henriques perceberam que a organização em castas era muito forte nas populações locais e começaram a adotar estratégias que visavam adaptar os dogmas católicos ao cotidiano das castas, como, por exemplo, a construção de igrejas específicas para castas "altas" e "baixas", objetivando manter a estrutura de pureza local.
É claro que medidas como essas geraram diversos debates, mas o interessante é que podemos verificar a existência de castas de cristãos.
Nesse sentido, não consigo perceber um movimento dos jesuítas com o objetivo de acabar com a organização em castas; pelo contrário, vejo grandes esforços no sentido de adequar a fé católica a essa estrutura social.
Espero ter respondido com clareza, muito obrigado pela atenção!
Atenciosamente,
Alexandre Cabús
alexandrecabus@ufrrj.br
Caro Alexandre,
ResponderExcluirMuito obrigado pela comunicação! É um tema que me interessa particularmente, uma vez que também pesquiso no meu doutorado sobre processos missionários na Ásia.
Minha pergunta é no sentido da própria política da acomodação. Por mais meritório que o padre de Nobili tenha sido na missão do Madurai, é curioso como esse método já era usado há algum tempo na China, através principalmente da ação dos padres italianos Matteo Ricci e Michelle Ruggieri. Seus métodos eram muito parecidos — a adaptação de vestimentas, a aproximação com as camadas eruditas e a adoção de certos preceitos religiosos e culturais, como o culto aos antepassados do confucionismo, por exemplo. Ricci e Ruggieri desenvolveram essa perspectiva na sua entrada na China, a partir de 1582, mas suas origens podem ser traçadas até antes, a partir dos escritos do visitador Alessandro Valignano na década de 1550, quando ele esteve no Japão.
Nesse sentido, minhas perguntas são:
1. É possível encontrar nas fontes diálogos entre de Nobili e os jesuítas que atuavam na China e no Japão quanto à acomodação? Seja como troca de informações, estratégias, métodos etc.?
2. Para além da curia romana, os jesuítas também encontraram oposição entre as outras ordens que atuavam na missão do Madurai? Penso, em especial, no caso dos franciscanos, que foram opositores de primeira hora na acomodação chinesa.
Muito obrigado!
Cláudio César Foltran Ulbrich
Prezado Cláudio,
ResponderExcluirAgradeço pelas perguntas e pela leitura atenta do texto.
Sobre a dinâmica de troca de informações, não conheço, particularmente, nenhum documento específico escrito ou direcionado por Roberto de Nobili com esse objetivo. No entanto, Adone Agnolin (2020), Inês Županov (1999) e outros autores destacam que a Querela dos Ritos Malabares, um debate sobre a legitimidade da estratégia de Nobili, adquiriu proporções globais, forçando os membros da Companhia de Jesus a se posicionarem sobre a questão. Assim, é possível identificar muitos defensores da estratégia adotada por Nobili.
Quanto ao desenvolvimento de práticas adaptativas nas missões jesuíticas, destaco a análise de Célia Cristina Tavares em "Mediadores culturais: jesuítas e a missionação na Índia" (2003). Nessa obra, a autora ressalta uma tradição de práticas adaptativas que remonta a São Paulo e aos escritos de Inácio de Loyola. Ela também explora o caso do jesuíta português Henrique Henriques, que atuou como missionário na Índia entre 1548 e 1600, sendo pioneiro em várias práticas adaptativas, especialmente na região da Costa da Pescaria.
Em relação à oposição de outras ordens religiosas às estratégias adaptativas, é notável que o debate transcendeu os limites da Companhia de Jesus. Um exemplo significativo é o memorial do capuchinho François Marie de Tours, publicado em 1704, no qual ele elencou 36 objeções às práticas jesuíticas. Esse movimento culminou na proibição oficial de tais abordagens em 1744, com a promulgação da bula Omnium sollicitudinum pelo Papa Bento XIV.
Espero ter abordado todas as questões levantadas. Mais uma vez, agradeço pela atenção e pelo interesse.
Atenciosamente,
Alexandre Cabús
alexandrecabus@ufrrj.br